1. Geografia das relações étnico-raciais no Brasil e na América Latina

 

      As questões étnicas e raciais são constitutivas da América Latina desde o processo de colonização/conquista/invasão européia e a conformação do sistema mundo moderno-colonial que nos habita ainda hoje. Trata-se de um tema complexo sobre o qual não há consenso. Assim, a questão étnica e racial, apesar de sua presença no dia-a-dia das relações sociais e de poder, tanto como discurso quanto como prática, conforma-se também como um tabu.

   No que toca especificamente o Brasil – o que pode de alguma forma ser expandido para países das Américas –, embora encontremos a questão étnica e racial no discurso geográfico do século XIX e início do XX, notamos que o tema se torna rarefeito a partir do momento que a Geografia se institucionaliza com o surgimento das universidades brasileiras.

     Apesar dessa temática se fazer presente em obras clássicas como a Antropogeografia de F. Ratzel (1882), nos escritos de Élisée Reclus sobre Escravidão nos Estados Unidos (1860) e no Princípios de Geografia Humana (1951[1922]) de Vidal La Blache, tais discussões não foram apropriadas pela intelligentsia geográfica, a não ser em obras isoladas e sem expressão.

     Recentemente, entretanto, após um período longo de silêncio, alguns autores na Geografia brasileira, sob a influência da ação dos movimentos negro e indígena, recolocaram a questão sob análise ao problematizarem as desigualdades constitutivas do espaço geográfico brasileiro e os conflitos territoriais em que estes grupos estão envolvidos, rompendo, assim, com uma tradição que naturalizava essas desigualdades. Nos últimos vinte anos, há um crescente número de publicações de livros e artigos que abordam essas temáticas de forma crítica sobre a população negra e sobre os grupos indígenas.

     Desde a década de 1990, dissertações, teses e periódicos especializados ganham relativa importância em eventos de geografia, em mesas de debates e grupos de trabalho, sobretudo naqueles promovidos pela AGB (Associação dos Geógrafos Brasileiros).

    No contexto latino-americano, é possível perceber que a questão étnica e racial ocupa cada vez mais as agendas de pesquisadores. Há uma tradição teórica consistente na América Latina/Abya Yala com uma vigorosa produção em torno da questão indígena, como indicam as obras de José Carlos Mariátegui e Anibal Quijano, entre muitos. No Caribe, há uma produção de grande relevância teórico-política que se desenvolveu a partir do lugar do negro na formação do sistema mundo moderno-colonial, com destaque para autores como Aymée Cesaire e Franz Fanon. O Lemto, a partir desse Eixo de pesquisa, se associa a essa tradição através de abordagens espaciais que focam conflitos, tensões e ações políticas em contextos específicos de Estados Nações e Estados Plurinacionais, bem como, em contextos transnacionais e diaspóricos envolvendo ambas as populações.

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